Cobrança internacional de créditos para empresas exportadoras: a importância de sermos Europa.

Fev 18, 2020

Cobrança internacional de créditos para empresas exportadoras: a importância de sermos Europa.

Fev 18, 2020

Uma pequena fábrica têxtil portuguesa fornece artigos a uma empresa de vestuário francesa. Tendo a empresa francesa deixado de cumprir os pagamentos devidos, a empresa portuguesa suspende os fornecimentos, mas fica com milhares de euros por receber. E agora, como pode a empresa portuguesa cobrar a dívida em França?

Perante a complexidade dos diferentes sistemas judiciais e legislações nacionais dos vários Estados-Membros que integram a União Europeia, as empresas sentem-se desencorajadas perante a ideia de avançar com ações judiciais no estrangeiro, face à dificuldade, morosidade e onerosidade das mesmas. Esta postura, segundo dados mais recentes, pode significar uma perda de cerca de 3% do volume de negócios anual em dívidas incobráveis.

Na União Europeia, as pequenas e médias empresas (PME) representam 99% do tecido empresarial e destas, 93% têm 10 trabalhadores ou menos (in relatório anual 2018/2019 sobre PME’s europeias). Para estas micro PME, cobrar com sucesso uma dívida de € 5.000,00 tem um peso muito significativo na balança financeira.

Face à inevitabilidade da cobrança transfronteiriça, hoje, uma empresa europeia dispõe de mecanismos europeus facilitadores da cobrança, numa lógica de justiça da União Europeia mais acessível, a favor das trocas comerciais e do crescimento comum.

Falamos do procedimento europeu de injunção para pagamento (PEIP), do processo europeu para ações de pequeno montante (PEAPM), do título executivo europeu (TEE) e da decisão de arresto de contas bancárias.

Em comum, estes quatro procedimentos caracterizam-se por serem:

  1. Simplificados;
  2. Rápidos;
  3. Com custo muito reduzido;
  4. Acessíveis diretamente às empresas;
  5. Não exigem a obrigatoriedade de representação por advogado;
  6. Dispensam, em determinadas condições, a presença em tribunal.

Basta apresentar o formulário respetivo e o procedimento segue o seu curso. O Portal Europeu da Justiça disponibiliza toda a informação e ajuda (https://e-justice.europa.eu/).

Além dos procedimentos que culminam com uma decisão exequível no espaço europeu sem necessidade de outras formalidades (injunção europeia e ações de pequeno montante), tem sido aperfeiçoado o processo de reconhecimento e execução de sentenças estrangeiras. Mais recentemente, em vigor desde janeiro de 2017, é possível, em processos de natureza transfronteiriça, obter uma decisão europeia de arresto de conta bancária do devedor, titulada noutro Estado-Membro. Uma forma de diminuir o risco de incobrabilidade e, consequentemente, incentivar a economia e o investimento.

Apesar destas ferramentas de reação à dívida, a gestão da cobrança começa antes da existência da própria dívida.

Assim e numa lógica de compliance empresarial, é imperativo que a empresa implemente um procedimento interno, necessariamente ágil e simples, adequado à sua dimensão e sem implicar uma alteração da estrutura já existente que permita uma análise e gestão de risco constante. Entre várias medidas essenciais neste procedimento interno, estarão também a apresentação das condições gerais do negócio e a celebração de um pacto atributivo de jurisdição que defina o foro de jurisdição competente (que não passará pela mera inclusão numa fatura final…). Um procedimento paralelo à relação comercial (diríamos até, anterior) e que colabora com esta, dando confiança aos negócios e às relações entre empresas.

Numa altura de claro recuo do mercado único europeu, o risco da cobrança aumenta, diminuindo, consequentemente, a confiança das empresas. No entanto, aliado ao esforço de cada organização internamente, numa perspetiva de gestão diária do risco do negócio e das alternativas que o empresário dispõe para gerir as suas cobranças a União Europeia, num objetivo claro de desenvolvimento do espaço europeu de justiça, continua a apostar na simplificação de procedimentos, diretamente acessíveis às empresas, como veículo de consolidação e segurança das relações comerciais, tão necessário ao desenvolvimento económico. Percebemos aqui, quanto a este tema, a importância de sermos Europa.

Ana Rocha Alves, Advogada

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